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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014
16:38 10

Novas manifestações da classe média brasileira


A ampla difusão da TV por assinatura, o acesso à Internet, a baixa nos preços das passagens aéreas, o acesso a bens materiais de alta tecnologia e também ao ensino superior modificaram substancialmente o perfil da classe média alta brasileira. A turma tem ficado cada vez mais enjoadinha e tem compartilhado de manifestações de comportamento bem parecidas. Essa parada de globalização realmente tem o poder de padronizar as pessoas; e andando por aí, clicando por aqui, você pode encontrar alguns perfis de gente com atitudes e estilos muito semelhantes. Neste novo post resolvi reunir algumas dessas figurinhas que você facilmente pode encontrar por aí. 


Quase cidadania europeia

O brasileiro "cidadão europeu" está chateadíssimo com essa história de estar todo mundo viajando para o exterior agora. Há pouco mais de 10 anos viajar para o exterior era prerrogativa sua e de poucos. Agora toda essa ralé, sem sofisticação, com seus pacotes CVC podem usufruir daquilo que antes só ele podia conhecer. Sempre fazendo questão de esclarecer que não se encaixa na categoria "turista", porque a alcunha que lhes atribuí já diz, né? Ele é praticamente um cidadão europeu. Para essa pessoa, o tal do turista é uma figura repugnante. Turistar é coisa de povinho, com suas roupas de frio cafonas emprestadas pelo parente rico. Ele faz questão de mostrar que conhece profundamente todas as capitais e cidades glam europeias. Vai contar uma historinha, tem que inserir os nomes das ruas, ditas com o sotaque estrangeiro (francês, de preferência), para mostrar o quanto está inserido naquele lugar. Dão de vez em quando uma de Luciana Gimenes, e jogam expressões estrangeiras totalmente desnecessárias no meio das frases: "Gente, eu estava brincando! Foi apenas uma blague".

Pirei nas tecnologias

Este aqui é o desesperado por novas tecnologias. Passa o ano comendo mal, muquiranando para todas as coisas mais básicas da vida, mas tem seu Iphone de última geração e o tal do Macbook Air que equivale ao preço de pelo menos três notebooks razoáveis ("compensa, não trava"). O seu lugar é, claro, o paraíso do consumo, os Estados Unidos. Todo ano tem passagem obrigatória nos States. Caso contrário, é o mala que perturba viagens alheias, incomodando a tia da amiga da namorada, que ele soube que viaja em breve, fazendo as encomendas mais inconvenientes. Adora camisetas outdoors com o nome da marca famosa explícito, usa tênis esportivo chamativo caro para ir a qualquer lugar e tem o dedo podre pra escolher modelo de óculos e relógio. Este, de preferência o mais feio e grande da Michael Kors.

O/A VIP

No falecido Orkut este estaria em comunidades como "Sua inveja faz a minha fama", ou, "Deus me disse: desce e arrasa". Sua autoestima baixa e espírito invejoso é compensada na busca por provocar nos outros o mesmo sentimento. Por isso, seu objetivo é mostrar que é melhor que todo mundo, e que tem uma vida também muito mais bacana e divertida. Assim, é o cara que "não se mistura" e só vai para festas "selecionadas" ou com espaços selecionados. Não pode deixar de registrar tudo amplamente nas redes sociais, e se puder pôr também em alguma coluna social, melhor ainda. Como quem procura, acha, são pessoas que vivem reclamando de sofrer de inveja dos amigos ou amigas. Um sofrimento talvez um tanto gostoso de se sentir... Ah, e os homens dessa categoria costumam acusar todas as mulheres de serem interesseiras. Também, né, amigo, quando o único valor que você demonstra é o dinheiro, não há como atrair gente diferente.


Fotógrafo/a e fashionista



Com a disseminação das redes sociais, todo mundo tem seu espaço para ditar tendência. O fotolog foi responsável pelo boom da fotografia no Brasil, e até hoje essa mania se perpetua no Flickr e no Instagram. Muita gente acabou fazendo fama com fotografias lindas e conceituais. Só que a coisa foi se pasteurizando, e já dá pra encontrar um padrão nessa galera. Principalmente, entre as garotas. Antes de fazer o blog, prestei mais atenção no que faziam as blogueiras bem sucedidas, e observei que boa parte delas apresentavam características semelhantes (vou até imitar depois, pra ver se dá sorte). Um blog de sucesso tem que ter, claro, fotos, muitas fotos (tô pecando nisso). E algumas que você pode ver pelo menos em um em cada três blogs são: fotos com gato preto; fotos com frutas vermelhas como amora, cereja e morango; fotos mostrando a cor do esmalte; fotos na Starbucks. Livro favorito: "Alice no país das maravilhas". Filme: "O fabuloso destino de Amélie Poulain" ou "500 dias com ela". Um lugar: Paris, Londres ou Nova Iorque. Ícone da moda: Audrey Hepburn, em "Bonequinha de Luxo". O que não pode faltar na bolsa: batom da Mac.

Esqueci de mais algum? Pode acrescentar nos comentários. :)


























segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014
13:56 3

Gula: um pecado subestimado

As leis cristãs nos ensinam que existem sete pecados capitais: a gula, a avareza, a luxúria, a ira, a inveja, a preguiça e a vaidade (ou orgulho). A vida já me ensinou que não existe um que possa ser tão pior que o outro. Quaisquer deles em grandes proporções podem trazer resultados trágicos.

"Qual é o seu pecado?", alguém da mesa pergunta. A resposta é quase sempre a mesma. A inveja é negada por todos. A luxúria e a ira geralmente são evocadas pelos homens que querem parecer mais machos; a vaidade ou orgulho, pela galera da alta autoestima excessiva. Enquanto a gula e a preguiça são os pecados mais admitidos e socialmente aceitos.

Aí eu digo que meu grande pecado é a gula. Alguém sustenta um "não valeu". Porque há quem ache que simplesmente ter fome e ter vontade de comer já configura o pecado. Sempre tem uma magrelita que se diz gulosa. Você faz o teste da pizza e a danadinha come duas ou três fatias, e já se diz satisfeita. Faz-me rir! Vou dizer pra você o que é uma pessoa gulosa.

Uma pessoa gulosa não consegue respeitar tira-gostos. Se você tem intimidade com o grupo, já senta do lado do patê e da torrada e vai metendo bala. Se não tem intimidade, tudo que está ao seu redor perde o interesse. Você não se concentra mais nas pessoas e no que elas estão dizendo, você pensa apenas quantos segundos ou minutos tem que aguardar para pegar o próximo salgadinho sem parecer uma desesperada. A conversa começa a perder o ritmo. E a coisa só fica pior quando você percebe que existe outra pessoa gulosa na roda. Começa um confronto silencioso, "pqp, esse safado tá comendo muito rápido, vai acabar tudo". Aí você apressa o passo, tentando não perder a elegância, que esse escroto não tem pudor algum em perder. 

Dividir comida também é um problema. Peraí, deixa eu explicar. O egoísmo não chega a tanto! No meu caso, não tenho problema em dividir a comida que está dentro de uma panela, e cada um pôr no seu pratinho o que tem vontade de comer. O problema é quando você faz o seu prato com uma quantidade mediana de comida, cria a expectativa de comer tudo que ali está, e vem algum folgado roubar o que há de melhor no recipiente. Situação pior: quando você guarda, por exemplo, aquele sushi mais gostoso pro final, e vem uma pessoa cheia da intimidade dar uma roubadinha. Dá logo uma pontada no coração. A boca fica salivando com a expectativa da mordida perdida. 

E quando querem um pedaço de um bocadinho de comida, como uma trufa? A mordida extingue logo 40% da bolinha. Prejuízo para a trufa e para o bolso. Pague logo metade dessa danada, camarada! 

O momento da divisão em fatias de alguma comida também é um conflito. Se você tem irmãos selvagens, pior ainda. A partilha de uma pequena torta ou de uma pizza, pode gerar grandes discussões. "Ei, o seu pedaço tá bem maior que o meu!". 

É feio, muito feio. Pecadinho egoísta pra caramba. Juro que estou tentando me tratar, pra me transformar apenas numa comiloninha, e não numa gulosa.

Por outro lado, os pecados também têm o seu caráter transgressor; e mais uma vez a questão de gênero aparece. Ser uma mulher comilona também é ser passível de julgamentos machistas. Um homem comilão demonstra sua virilidade, voracidade, quase um reflexo que é comedor em outro níveis. Ele é um selvagem, um homem das cavernas. Precisa comer muito, para fazer todas aquelas atividades que exigem do seu físico de macho (eu digo: RUM, até parece, trabalhadorzão!). Já as mulheres têm que comer pouco, para deixar comida suficiente para o seu macho ou para a prole. Devem demonstrar também que é alguém que não dá muitas despesas, e claro, não vai engordar muito.

É assim que o patriarcado interfere até no seu apetite! Tá de brincadeira, né? É por isso que não só se revoluciona na luxúria, há revolução na gula também!

Então, não subestime a gula no seu poder de destruição social; nem no de revolução. Pode pegar o pote de Nutella e detonar, amiga. Só não esqueça de deixar umas colherzinhas pra turma. 





quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014
11:14 6

“Não ande com brasileiros”


Em 2008, resolvi me aventurar num intercâmbio na Europa. A cidade escolhida: Lyon, França.

Antes de embarcar, além de todos os preparativos formais, todas as coisinhas para listar e não esquecer de pôr na mala; várias pessoas vieram me fornecer algumas sugestões, solicitadas e não solicitadas. O que vestir, o que não levar na mala, o que comprar aqui, o que comprar lá, alerta para o mau humor francês, etc, etc.

Sem dúvida, um ponto em comum entre as diversas recomendações era o tal de “não ande com brasileiros”. Era a sugestão dada geralmente por quem nunca tinha tido a experiência de fazer um intercâmbio, mas que conhecia alguém que tinha ido e que tinha feito a grande bobagem de interagir demasiadamente com brasileiros.

É uma preocupação compreensível, e por isso muita gente viaja com isso na cabeça. Fazer intercâmbio é o momento de você conhecer uma cultura totalmente diferente da sua, você precisa praticar o idioma estrangeiro e se tornar fluente, precisa se inserir no cotidiano daquele contexto. Enfim, são coisas que o convívio com pessoas da mesma nacionalidade podem interferir para uma inserção mais profunda.

Cheguei lá, com um grupo de brasileiros da mesma Universidade, e pensei que até seria bom me distanciar um pouco deles quando estivesse totalmente estabelecida. Só que além destes, dezenas de outros brasileiros de outros estados e regiões também estavam chegando por lá. E aí, não teve mais jeito, passei a conviver com todos, e fui totalmente conquistada.

Não me culpem, os brasileiros e as brasileiras são irresistíveis. E digo o porquê.

Porque no meio daquela calmaria francesa, quem rompia o silêncio com gargalhadas gostosas e altas, só podia ser o povo do Brasil. Aliás, percebemos que somos bons nisso de dar risadas. E que somos um tanto escandalosos também, porque vez ou outra tinha quem viesse reclamar do barulho.

Começou a nevar. Com quem partilhar tamanha emoção? Com os amigos brasileiros, claro. Deitada na minha caminha, bem displicente, recebi um monte de mensagens: "Mariana, olha a janela!", ou, "Neveeeee!!!". Depois quando perdia a graça tanto branco e tanto frio, também sentávamos e nos lamentávamos com saudade do sol.

Se não andasse com brasileiros, eu iria perder a oportunidade de falar várias atrocidades em português na cara de algum francês chato, ou até elogiar descaradamente um francês gatinho sentado no assento da frente no metrô. E ainda fazendo a atriz, com expressão de quem estava falando sobre o tempo.

E mais, como poderia resistir a três estudantes de moda do Ceará, com aquele sotaquinho de Fortaleza, meio Norte, meio Nordeste, e assim... como posso dizer pra "tchi"... alegres, coloridas e criativas. Dava logo vontade de dizer, "vamos ser amigas?".

Que graça teria se não tivesse os cariocas chamando atenção na pista de dança, com seu estilo de dançar único, desafiando minha falta de remelexo no quadril e deixando as francesinhas (e outras gringas) enlouquecidas? Como eu teria contato direto com fofocas sobre artistas globais e outras celebridades, verificadas in loco!? Babados fortíssimos e exclusivos.

E os paulistas? Tive oportunidade de conhecer uma variedade de sotaques que passa pelos VJs da MTV, vai pra comunidade italiana e termina no linguajar dos manos. Uma puta vida difícil que eles levavam na capital paulista; três horas ou mais pra pegar a "condução" pra chegar no "trampo" ou na "fefelesh" (FFLCH). Sempre gargalhando na cara de quem precisava acordar "cedo" no outro dia, porque cedo não é 7 ou 8 horas da manhã; um verdadeiro metropolitano só reclama quando tem que levantar pelo menos às 4 horas!

Não poderia deixar de falar dos vizinhos pernambucanos. De vez em quando tratavam nós paraibanos como um irmão mais velho pentelhando o caçula. Enchiam o saco dizendo que éramos pequenos e inaptos, mas no fundo nos amavam e se identificavam conosco. Coisa mais linda aquele povo do Recife, com suas camisas do Sport, do Náutico e do Santa Cruz. Maior orgulho do mundo de onde vieram, e com razão. Sempre fazíamos uma união pró-Nordeste, pra desafiar o novo amiguinho que queria rir do nosso sotaque. No final, já estávamos pelo menos a contagiar os artigos antes de nomes próprios, e tinha quem chegasse a soltar um "oxe".

Sem falar nas pessoas de outros lugares do país: as sulistas lindas e bacanas, com suas expressões diferentes; os mineiros gentis com o sotaque mais fofinho do mundo; fora, claro, meus queridíssimos conterrâneos, que foram verdadeiros brothers and sisters.

Aí foi isso, fui conhecer o estrangeiro, e acabei também conhecendo o Brasil. Não, não, não montei nenhuma comunidade brasileira, nem fiz parte de um gueto. Aprendi francês, comi escargot, aderi à rabugentice para momentos adequados. Agora o melhor de tudo: fiz muitos amigos. Da França, do mundo todo...  porém, não vou mentir, os mais especiais moram aqui do lado e têm o lugar mais especial no meu coração.